A efemeridade dos videogames atuais

Como de costume, vou começar me desculpando pelo novo período relativamente longo sem novas postagens, a última vez que passei por aqui foi no final das Olimpíadas. Acho que os poucos que ainda aparecem por aqui (excluindo os anônimos covardes que só aparecem para encher o saco nos comentários) já devem ter se acostumado com minhas pausas cada vez mais frequentes e longas. Acho que faz parte, especialmente quando passamos por momentos de muita correria e obrigações na vida fora do ambiente virtual. Mas volto para falar de um tema mais geral, algo que eu estive pensando nesses dias e achei válido de discutir.

Tudo motivado por uma notícia recente de um joguinho de celular que eu curto, que serve como um bom passatempo, que é o Simpsons Tapped Out. Para quem não conhece, um jogo onde você vai montando a sua Springfield, desbloqueando personagens e construções enquanto cumpre missões que aparecem de tempos em tempos. Um típico idle game, em que você pode mandar os personagens da família amarela mais famosa da TV fazer atividades durantes alguns minutos e horas, para ganha dinheiro do jogo e com isso comprar mais itens. Ah, não vou explicar mais, o foco da postagem não é sobre o jogo em si, se quiser vai lá no Google e procura.

O assunto é que nesta sexta-feira, 27 de setembro, toda uma extensa base de jogadores foi surpreendida com a mensagem abaixo, ao abrir o aplicativo: dizendo que ele vai sair das lojas online no final do mês que vem, e os servidores serão finalmente desligados em janeiro de 2025, a partir de quando ninguém mais poderá jogar.

Digo que fiquei chateado. Sempre joguei em modo F2P (ou seja, sem gastar um centavo de dinheiro real), mas mesmo assim já vinha construindo a minha Springfield há alguns anos, algo razoável de se fazer uma vez que o jogo sempre foi relativamente generoso em dar moedas premium para comprar os itens mais caros. Mesmo assim, deu um desânimo em saber que daqui alguns meses esse jogo vai deixar de funcionar. Fico pensando como devem estar milhares de outros jogadores, incluindo aqueles que investiram dinheiro de verdade em um joguinho, para ver tudo desparecer.

Nessas horas, sempre aparecem os escrotos zoando e desqualificando aqueles que gastam com micro-transações, que nesse momento devem estar rindo aos montes ao ver os jogadores de Tapped Out passando por aquela sensação de "dinheiro jogado no lixo". Afinal de contas, o mundo tá cheio de filho da puta que tem prazer em ver o infortúnio dos outros. 

Embora eu saiba que tem pessoas que exageram e que há jogos que são extremamente mercenários a ponto de colocarem preços exorbitantes em itens digitais, na minha opinião cada um faz o que quiser com seu dinheiro. Eu mesmo já usei alguma grana em certos jogos, de forma comedida. Se é algo controlado e que você queira fazer, mal não tem. 

Enfim, mas eu também não vim aqui para falar das micro-transações, DLCs e dos gastos com os jogos da atualidade, embora tenha muito a ver com o que eu realmente quero comentar, que é sobre como os videogames hoje em dia estão se tornando diversões temporárias, com um ciclo de vida finito e relativamente curto, quando falamos de jogos eletrônicos. 

Se você curte jogos de celular ou mesmo de computador, provavelmente será capaz de enumerar alguns deles que foram extintos ou que se encontram hoje em um estado de abandono. Por exemplo, só considerando alguns joguinhos que eu já citei aqui, há muito tempo tinha o Sims Social, onde você podia criar um personagem do The Sims no Facebook e jogar com seus amigos, mas que saiu do ar em 2013. Embora não tenha citado aqui, a Electronic Arts também tinha o sensacional Need for Speed World, que mesclava as cidades dos jogos Most Wanted e Carbon mas em um ambiente com múltiplos jogadores, onde dava pra disputar um racha com gente do mundo todo. Outro jogo que foi tirado da tomada, embora alguns fãs conseguiram colocar servidores privados para manter o jogo ainda vivo. Falei algumas vezes sobre Cause of Death, com sua história policial no estilo livrinhos Escolha sua Aventura, também da EA e que também foi apagado da existência, mesmo não sendo de estilo online. E eu não poderia deixar de citar os dois jogos do Moe! Ninja Girls que apareceram várias vezes aqui, com o RPG sendo excluído também, enquanto o jogo principal ainda sobrevive mas sem novos conteúdos, até que a empresa decida deletar os arquivos do servidor. E agora, o mais recente à lista é justamente o jogo Tapped Out dos Simpsons, que motivou essa postagem.

Certamente não faltam exemplos de jogos finados e que não podem mais ser jogados. Certamente você deve citar vários outros, provavelmente mais famosos e badalados que os que apareceram aqui no blog.

Eu até entendo isso acontecendo com certos jogos online, especialmente aqueles de múltiplos jogadores. Nesses casos, é esperado que existam servidores de alta capacidade e que precisam ficar ligados 24/7, com uma boa velocidade de internet e elevada capacidade de armazenamento. Manter toda essa estrutura certamente não é barato, uma hora provavelmente a conta não vai fechar, e é até esperado que os servidores sejam desligados, acabando com a brincadeira.

Acontece que tem muitos jogos que não necessitam dessa estrutura. São muitos que fazem o acesso ao servidor de forma mais esporádica, normalmente para baixar alguma atualização do aplicativo ou mesmo o conteúdo do jogo, seja o convencional ou específico de um evento, ou na hora de acessar a loja de fazer alguma micro-transação. Fora isso, a ação ocorre apenas no computador ou dispositivo do jogador, de forma individualizada, no máximo com algum ranking semanal que oferece bônus ou coisa parecida.

Nessas situações, acho que há opções ao cancelamento definitivo. Ora, acaba com os rankings, acaba com os eventos sazonais, mas dá para manter o jogo funcionando. Sobre o conteúdo, não me parece difícil implementar alguma atualização final para que seja feito o download de todas as imagens, músicas, vídeos e demais informações necessárias para jogar, de forma que aquele jogador, que assim quiser, possa baixar tudo e manter o jogo "jogável" mesmo depois do desligamento do servidor. 

Certamente há opções tecnicamente viáveis para manter o jogo funcional, mas a grande maioria dos desenvolvedores não pensa assim.

Há quem possa alegar que uma sobrevida aos jogos é impossível por conta de uma eventual incompatibilidade com o sistema operacional do hardware que vai rodar o jogo. É o caso de certos jogos antigos de computador, da era do DOS. Alguns sequer conseguem mais ser instalados (ainda mais aqueles que vinham em CD, algo que não pode ser lido nos atuais computadores), outros dão erros de DLLs ou coisa parecida, e aqueles poucos que passam pela etapa de instalação muitas vezes apresentam problemas ao rodar: vai desde travamento de tela até o absurdo de ficarem em altíssima velocidade, por conta de terem sido desenvolvidos para processadores bem mais lentos que os que existem hoje em dia.

Mas ainda assim, como são jogos de computador, muitas vezes há formas de contornar as questões técnicas. É onde entram os emuladores, por exemplo. Mas é algo muito mais difícil quando falamos de jogos de celular e tablet, considerando a obsolescência programada que é promovida pelos produtores de dispositivos. É só ver como os sistemas operacionais portáteis são atualizados quase que semestralmente, e na maioria das vezes essas novas atualizações causam algum tipo de dificuldade para o usuário, como impossibilitando o funcionamento de certos aplicativos. E em paralelo a isso, os dispositivos estão com ciclos de vida ainda mais curtos, chega uma hora que um determinado celular já não suporta mais atualizações e fica obsoleto. Sem falar que tenho a opinião de que se trata até mesmo uma questão de hardware com vida muito limitada, por mais que você cuide do aparelho tem horas que as coisas deixam de funcionar, como superaquecimento, travamentos e descarga de bateria... tudo para te forçar a comprar um novo celular, que provavelmente não vai aceitar mais aplicativos que você queira manter, ao mesmo tempo que outros aplicativos começam a exigir a mesma atualização.

Sério, daria uma postagem inteira sobre a obsolescência programada da tecnologia atual, não se restringindo a celulares...

Vale comentar que isso se aplica não somente aos jogos de celular, que baixamos de lojas de aplicativos. Hoje em dia até os jogos de computador mudaram totalmente a sua forma de disponibilização, nada mais de comprar um CD ou DVD físico dentro de uma caixinha de papelão, agora tudo é baixado pelas plataformas como Steam. Se por um lado há uma praticidade maior, até para instalar de forma relativamente simples, surgem as outras travas e dificuldades, como a necessidade de estar conectado à Internet e tendo que logar na loja para acessar o jogo. Ou seja, no final das contas, quando um belo dia decidirem tirar algum título da plataforma, ninguém mais vai poder jogar. Pior ainda, chegando o dia em que tal plataforma deixe de existir... serão milhares de jogos que vão junto.

E como hoje tudo está praticamente só no mundo digital, quando esses jogos saem das lojas de aplicativos e os dispositivos vão deixando de funcionar, isso significa que eles deixam de existir para sempre. As únicas memórias desses joguinhos serão algumas imagens na Internet, os vídeos de gameplay no YouTube e coisas parecidas... até que essas imagens, vídeos e demais referências venham também a desaparecer por completo. Não importa o quanto você tenha gostado de um determinado jogo que chegue ao fim, muito provavelmente você nunca mais terá a chance de jogá-lo, nem mesmo um pouquinho.

Pessoalmente, acho isso muito desagradável. Felizmente, a maioria dos títulos que me marcaram são da época dos consoles, que de alguma forma ainda conseguem permanecer disponíveis. Não apenas nos emuladores, cujos arquivos geralmente são mais fáceis de manter, já que eles são "offline", mas até mesmo algumas pessoas têm até hoje seus videogames originais, com os cartuchos e mídias ainda funcionais. Agora, certos jogos mais recentes, que eu gostaria de ter mais uma chance para jogá-los, ou mesmo poder terminá-los... cada vez mais vejo isso sendo mais difícil, me perguntando por quanto tempo mais os que jogo hoje, em meu celular e tablet, ainda vão funcionar.  

Eu tenho a certeza que podem aparecer pessoas que vão criticar a minha opinião, dizendo que eu deveria aprender a me desapegar, que deixarmos de ter acesso a certas coisas é saudável e ideal, que o certo é deixar para trás e focar em coisas novas. Honestamente... cada um tem direito a sua opinião sobre qualquer coisa, e eu acho esse tipo de pensamento uma babaquice.  

Afinal de contas, todo mundo assiste de novo aqueles filmes que curte, todo mundo gosta de ver de vez em quando aquela série que marcou, todo mundo acaba relendo um livro que lhe causou grande impacto, todo mundo viaja de férias novamente para aquela cidade que foi agradável, todo mundo pede aquele mesmo prato favorito no restaurante para satisfazer seu paladar. Por que não podemos jogar um jogo de videogame mais de uma vez?

Na boa, não tem nada que diga que somos obrigados a sempre buscar novas experiências, que devemos fazer tudo uma única vez... Se algo nos dá prazer, se é alguma coisa que gostamos e curtimos, não tem nada de mais em reviver essas experiências. Pessoalmente, tem horas que é muito melhor termos a certeza que faremos algo que vai nos fazer felizes e nos deixar bem, do que tentar alguma coisa nova e incerta, só pela ânsia de fazer algo diferente.

A grande verdade é que essa digitalização imensa acaba forçando que as coisas deixem de existir. Tudo agora fica na nuvem, nos servidores, e chega a ser até um pouco assustador como que tanta informação é armazenada de forma volátil, podendo ser apagada ao apertar de um botão. E não me refiro somente aos joguinhos de celular que você curte, mas muitas coisas mais...

Por exemplo, imagine que agora filmes e séries ficam somente nas plataformas digitais. O que significa que um belo dia um determinado filme pode ser removido de todos os lugares, para jamais ser visto, a não ser por aqueles que tenham feito uma cópia de alguma forma. O mesmo vale para músicas, livros e até mesmo o dinheiro. Afinal de contas, os bancos hoje podem simplesmente tomar todo o seu dinheiro (que já existe de forma virtual), e você ficará sem nada.

Outro tema que valeria uma postagem... Por ora, apenas digo que eu sempre tenho cópias do máximo de coisas comigo, pois nunca sabemos quando alguém vai decidir que não poderemos mais ler, assistir ou jogar algo que a gente queira.

Acredito que seja até por isso que eu costumo fazer muitas postagens de jogos aqui. Talvez para aproveitar enquanto eles estão acessíveis, para registrar curiosidades e coisas legais a respeito deles, imaginando que um dia não poderão mais ser jogados. Como já disse, tende a ser menos crítico para os títulos dos consoles, ainda jogáveis graças à magia dos emuladores; mas, e quanto a jogos que eu jogo hoje? Sejam aqueles que eu curto e jogo bastante ultimamente, como Azur Lane e Streets of Rage 4, sejam aqueles que eu vejo de vez em quando para dar algumas risadas como o Konosuba, sejam os joguinhos mais bobos e simples que ajudam a passar o tempo como Highway Rider, sejam até mesmo os toscos e absurdos como Sexy Airlines... Sem falar outros que podem aparecer no futuro e ainda eu não conheça.

Dá sim um desânimo ter a certeza que um belo dia chegará um anúncio como milhares de jogadores do Simpsons Tapped Out viram nesta sexta, dizendo que o jogo está com os dias contatos... 

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