Jogadores "sensíveis"

Tem horas que eu decido escrever sobre algum assunto aqui no site, mas no meio do caminho eu acabo indo para outra direção. Muitas vezes isso acontece durante as pesquisas que faço sobre o tema original, e aí eu começo a ver alguma coisa correlata que me chama a atenção. Tipicamente algo que me deixa perplexo, surpreso ou incrédulo. E como polêmicas "vendem mais" e dão mais espaço às opiniões diferentes e bem particulares como eu costumo ter, o assunto original vai pra geladeira e nasce uma postagem distinta.

O meu objetivo original era falar sobre um simpático jogo de cartas que descobri há algum tempo, chamado SOS Titanic. Como eu ainda pretendo escrever em maiores detalhes a respeito deste jogo, não vou dedicar muito tempo nisso. Apenas cito que ele é muito parecido com o velho Paciência, aquele clássico que todo mundo já jogou no Windows, mas formatado em torno do resgate dos passageiros do Titanic, famoso transatlântico que afundou após bater em um iceberg. Embora mantenha a mecânica do popular jogo de baralho que todo mundo conhece, SOS Titanic traz algumas peculiaridades interessantes.  

Vendo algumas postagens do jogo no Board Game Geek, vi que recentemente foi lançada uma segunda versão (o que terá algo a ver com o tema dessa postagem a também da que farei depois). Mas o que me chamou a atenção foi uma discussão que começou com a alegação de que se tratava de um jogo de mau gosto, por falar do trágico acidente. Li as diversas respostas, com diferentes pontos de vista, e dali ainda acabei sendo levado a outras páginas de outros jogos, onde discussões semelhantes se desenrolavam, sempre iniciando com a mesma questão: a alegação que um determinado jogo X era de mau gosto, por tratar de um tema sensível que não deveria estar sendo representado em um passatempo como um jogo de tabuleiro ou videogame.

Com isso, decidi escrever sobre a cada vez mais comum subespécie humana: os jogadores sensíveis.

Que a sociedade atual está ficando cada vez mais frouxa, isso não tenho dúvidas. Temos uma geração em sua maioria composta por bobocas, criados a base de leite com pêra e Danoninho, que se hiper-sensibiliza por qualquer bobagem. Por exemplo, tem o pessoalzinho que sofre de "eco-ansiedade", enfrentando surtos de desespero e crises de choro ao pensar no meio-ambiente; tem a turminha da ideologia de gênero, que fica angustiada e em prantos se aparecer algum "fascista" que o chame pelo pronome errado; tem também os ativistas do tal de "racismo estrutural", que defendem que tudo que é feito na sociedade moderna tem o objetivo de prejudicar os negros, acusando de racistas todos aqueles cujas ações tenham sido convenientemente interpretadas como opressora, ou até mesmo responsável qualquer situação em que um negro seja "prejudicado", desde ser reprovado em uma entrevista de emprego até ser detido após cometer um crime. 

Enfim, o que não falta hoje em dia é gente que fica se doendo por qualquer coisa, seja quando acontece com elas mesmas ou com terceiros. Afinal de contas, tá cheio de "justiceiro social" que tenta defender os fracos e oprimidos, mesmo quando estes não se sentem assim. Agora, pessoas que ficam hipersensibilizadas por causa de um jogo... faça-me o favor, pombas! Que frescura!

Citando o caso do jogo do Titanic em particular, eu fiquei lendo as postagens das mais diversas, criticando que se trata de um tema sensível que não deveria estar sendo representado em um passatempo, como um jogo de tabuleiro. Tudo isso por estar abordando uma tragédia onde várias pessoas morreram, e principalmente com uma mecânica de jogo onde o objetivo é salvar os passageiros do naufrágio. Vi até um sujeito dizendo que jogar esse jogo poderia causar uma experiência traumática e fazer com que o jogador fique "emocionalmente anestesiado", se tornando uma pessoa sem sensibilidade. E a discussão chegou até ao ponto de citar outros jogos, com relatos de indivíduos que, por exemplo, se recusam a jogar com os alemães em um jogo ambientado na Segunda Guerra Mundial.

Sério... cada um que aparece.

Como disse acima, hoje tem muita gente que é frágil como um cristal, e que fica se doendo por coisas pequenas. Sobre o tal jogo do Titanic, na minha opinião não tem nada a ver, não se trata de nenhum desrespeito às vítimas e tampouco representa uma temática de mau gosto para um jogo de tabuleiro. Trata-se apenas de um jogo que é baseado nesse acontecimento, não tem nenhum problema. Ainda mais considerando que o objetivo do jogador é justamente salvar os passageiros. O que tem de mau gosto nisso? 

Até entenderia alguém ficar meio incomodado se a temática fosse outra. Tipo, se fizessem um jogo onde você controlasse o iceberg com o objetivo de afundar o Titanic (pior que fizeram um jogo assim), até poderia compreender que seria algo meio controverso... Mas mesmo assim, não iria censurar a existência de um jogo desses. 

Aliás, recomendo olhar o link acima, para ver os comentários da única postagem no fórum, em que um monte de gente fica sinalizando virtude ao dizer que esse outro jogo é repulsivo, criticando até mesmo a sua existência e direcionando ofensas contra o criador. Na boa, se você não gosta, não joga, cacete! Mas essas pessoas, defensoras "dos bons costumes", têm a necessidade orgânica de criticar, de sinalizar virtudes e demonstrarem que estão em um nível moral superior aos demais.

Na minha humilde opinião, não temos que ficar problematizando algo que é tão pequeno como um mero jogo de tabuleiro. Não digo isso como forma de menosprezar esse ou aquele jogo em particular, mas sim de uma forma geral. Pois um jogo de tabuleiro ou videogame é um mero passatempo, algo que cada um tem o direito de consumir ou não, com o objetivo que quiser: seja para se divertir, para reunir os amigos ou até mesmo como forma de aprendizado. Tem coisas muito piores por aí, que de fato promovem valores deturpados (tipo, os degenerados que promovem mudança de sexo em crianças), mas não vejo essas supostas "pessoas de bem" criticando. Para elas, parece ser mais importante dizer que um mero jogo de tabuleiro baseado no naufrágio do Titanic é algo de mau gosto, em vez de condenar doentes que oferecem tratamentos para mudar o sexo de bebês de até 2 anos...

Achei interessante nessa discussão como que em um determinado momento apareceu alguém falando sobre o tema dos alemães na Segunda Guerra, comentando que ele se recusa a jogar qualquer wargame com eles, por conta de toda a referência ao nazismo. Já cheguei a ler sobre esse assunto em outros sites que não me lembro mais a referência, mas trazendo o mesmo argumento: se você jogar qualquer jogo baseado na Segunda Guerra Mundial com os alemães, isso seria algo anti-ético e errado, pois você estaria fazendo apologia ao nazismo.

Já vi debates semelhantes a respeito desse assunto. Afinal, há países onde qualquer menção aos símbolos do regime nazista é considerado um crime, atingindo até mesmo jogos de tabuleiro, videogames e modelos em escala, onde não é permitido mostrar a suástica, por exemplo. Mas mesmo em lugares onde não há esse tipo de proibição, fica muito evidente como que tem muita gente que "torce o nariz" quando vê um jogo de tabuleiro em que você comanda um submarino ou tanque alemão, por exemplo. 

E isso não se limita aos alemães. Cito até uma postagem que li há algum tempo, que fala daquele Kantai Collection que eu de vez em quando menciono por aqui: nela, o autor alega que o jogo japonês faz pouco-caso dos crimes de guerra promovidos pelo império japonês, transformando navios de guerra que mataram pessoas em meninas-navio com roupinha de colegial. E manda inúmeras críticas aos criadores do jogo e aos fãs, seguindo a mesma linha que seria uma postura de mau gosto jogar esse jogo.

Pessoalmente, acho que toda essa hiper-sensibilidade é exagerada... Jogar um jogo com os alemães não vai te tornar um nazista, pombas. Se fosse assim, então não podem criar nenhum tipo de jogo com dois jogadores ou mais que seja baseado em alguma batalha ou campanha da guerra, pois fatalmente um dos lados terá que comandar as forças militares de alemães, japoneses ou italianos, que compunham o Eixo. Qualquer pessoa com um mínimo de inteligência, bom senso e maturidade é capaz de perceber que se tratam de coisas diferentes, que é um mero jogo que não vai determinar nada sobre sua moral e valores. 

A menos que você seja uma pessoa fraca de espírito ou problemática, que não tenha a capacidade de separar a realidade da ficção, que não consegue entender que jogar um jogo não tem nenhuma consequência direta ao que acontece em sua vida. 

Isso tem a ver com a típica discussão que se tem contra os videogames "violentos" depois de um crime de grande repercussão e comoção, como um ataque à escola. Logo aparecem os "especialistas" afirmando que tais jogos precisam ser proibidos, pois eles são responsáveis por criar criminosos e psicopatas. O que não passa de uma bobagem sem tamanho, quem defende essa ideia deve ter merda na cabeça. Afinal de contas, se esse argumento fosse mesmo válido, bastaria então eu jogar horas do Flight Simulator para me tornar piloto de avião profissional...

Mas a frescura e chororô não se limitam ao tema do jogo ou a um dos lados envolvidos na disputa. Tem gente tão problemática e sensível que chega ao ponto de ficar com nojinho de um jogo só por conta de ter alguém envolvido em sua produção que não seja uma pessoa "de bem".

Coincidentemente, o mesmo jogo do Titanic teve um caso desses. Em particular por conta do dono da empresa que ficou responsável por produzí-la, como você pode ver nessa postagem sobre o assunto. O autor que criou a entrada no fórum chegou ao ponto de fazer uma outra postagem para listar uma série de "provas" de como o dono é um sujeito que não presta, supostamente um supremacista branco extremista e que não respeita os pronomes de pessoas trans.

E aí vemos uma turba de politicamente corretos babando de ânsia em sinalizar virtude, alegando que preferiram pagar mais caro pela versão original do que comprar essa nova, batendo no peito para dizer que jamais iria comprar algo de um supremacista racista, e até um que disse que convenceu um amigo a desistir da compra. Ou seja, promovendo o tão manjado "cancelamento", que é a tática usada hoje em dia para destruir aqueles que estão do lado "errado". Claro, e também destilando críticas contra aqueles que consideraram tal repercussão um exagero, como se estivessem deixando seus valores em segundo plano, pensando com a própria carteira.

Deixa eu respirar fundo...

Sinceramente... acho uma verdadeira babaquice isso tudo. Bando de babacas! Sério, muita frescura se recusar a comprar a pôrra de um jogo, só pelo fato do CEO ser alguém condenável. Acho um exagero e uma futilidade nesse tipo de demonstração de virtude sem sentido, digo de novo que acho uma estupidez ficar problematizando por conta de um mero jogo de tabuleiro e sobre o que o dono da empresa que o publica disse ou deixou de dizer.

Nessas horas eu me dou conta de como tem gente problemática nesse mundo, que fica achando problema onde não tem. Ou fazem isso para aparecer, ou não passam de verdadeiros palermas ruminantes, incapazes de pensar como uma pessoa normal. Tipo, veja essa postagem abaixo sobre a empresa do tal sujeito, em que uma mulher (que deve ser uma feministóide revoltada com a vida e que votou no Biden) criticando um jogo da empresa por ter um sapo fazendo o símbolo de supremacia branca.

Afinal de contas, como já disse há algum tempo, meia dúzia de retardados decidiu que o gesto centenário de OK passou a ser uma ofensa racista.

O que mais me deixa puto é que toda essa problematização é por conta de uma pôrra de um jogo, cacete! Isso vindo de canalhas que não demonstram nem um décimo dessa revolta contra coisas realmente sérias. Podiam estar incentivando boicote contra empresas que financiam aborto ou troca de sexo em crianças, condenando entidades e organizações que passam a mão na cabeça de assassinos, traficantes e demais criminosos, ou espalhando os podres de ditadores e magnatas que promovem censura e controle da sociedade... mas o que tira esses "justiceiros" do sério é o dono de uma produtora de jogos que fez piada com pronome neutro ou critica o Black Lives Matter. Pôrra, não fode! 

Tem mais. Como algumas pessoas mais sensatas disseram na postagem, um jogo não é (pelo menos na maioria dos casos) produto do esforço de uma única pessoa. Talvez esse tal CEO tão polêmico nem tenha ideia que quais são os jogos produzidos e lançados por sua companhia. Assim, promover a censura e o boicote à nova versão desse jogo do Titanic iria afetar várias outras pessoas da empresa, que não compartilham das mesmas opiniões ideológicas que o sujeito. Ou seja, uma política de cancelamento que poderia deixar muita gente inocente sem emprego, só para que alguns jogadores mais "virtuosos" possam mostrar para o mundo como que eles têm consciência social.

Na boa, eu adoraria debater com um pleura desses politicamente correto, teve uma hora que eu quase entrei na postagem do BGG para questionar esses putos sobre essa postura deles. Que pra mim não passa de birra contra um cara que eles não gostam, e que no fundo eles não são nem um pouco virtuosos assim. Tipo, perguntaria para um babaca desses a respeito do último jogo de tabuleiro que ele comprou, se ele tem a certeza absoluta de que não tinha nenhum supremacista branco em nenhuma das etapas de sua produção. Se ele pode assegurar que o dono da empresa que publicou o jogo, o artista que desenhou as cartas, o designer que bolou as regras, o desenhista gráfico que diagramou o manual, o relações-públicas que divulgou as notícias, que nenhum deles tem um podre qualquer em sua vida pregressa.

Duvido que saibam. Duvido que esses sinalizadores de virtudes possam assegurar que não apenas os seus jogos de tabuleiro, mas que todos os seus pertences, sejam livros, aparelhos eletrônicos, comidas e móveis, sejam oriundos de uma empresa 100% "qualificada", onde não tem nenhum racista, nazista, homofóbico ou afins.

Que foquemos apenas em jogos de tabuleiro. Pergunto para esses politicamente corretos se eles têm algum jogo com miniaturas. Caso positivo, muito provavelmente foram produzidas na China, por trabalhadores submetidos a condições semelhantes à escravidão. Talvez até com trabalho infantil.

E aí, seus cretinos? Podem garantir que seus jogos não foram produzidos nessas condições? E aí, onde fica esse discurso politicamente corretos, seus merdas?

Repito que tudo isso não passa de uma problematização exagerada. Na prática é impossível que alguém possa traçar todos os elos por trás da produção de qualquer coisa que consuma, seja um jogo de tabuleiro, um celular de última geração ou o sanduíche de seu lance. A cadeia é muito extensa, passando por centenas ou mesmo milhares de pessoas, cada uma delas com sua forma de pensar, com sua ideologia e moral. E por isso seria absurdo (diria até que idiota) deixar de comprar algo porque alguém nessa estrutura toda vai contra o que você pensa. Se fosse assim, a gente não poderia consumir pôrra nenhuma.

Fico até imaginando como que esses imbecis da postagem citada devem ser mesmo uns frutinhas. Fico imaginando que eles seriam capazes de deixar de jogar um de seus jogos favoritos se, em um determinado momento depois, um de seus produtores se declarasse um supremacista branco. Essa gente tem tanta titica na cabeça, que não ficaria surpreso que eles viriam com um discurso de sinalização de virtude, dizendo que se recusam a jogar de novo aquele jogo, pois descobriu depois que o dono da empresa que o lançou é uma pessoa "do mal".

Chega a hora de fechar a postagem, já escrevi muito. Mas é um tema que eu acho engraçado, me diverte ver como tem pessoas que tentam demonstrar que são virtuosos e politicamente corretos, mas o fazem com coisas banais e mundanas, como um mero jogo. A necessidade em se apresentar como um defensor da moral e dos bons costumes nessas situações é muito fácil, queria ver era defender pautas realmente importantes, que de fato afetam a sociedade. Mas é como eu disse, trata-se de uma geração Nutella, cheia de frescura, que se ofende com jogo baseado no naufrágio do Titanic, que tem nojinho de controlar os alemães em um jogo de guerra ou fica dando piti porque um sujeito lançou um jogo com um sapo fazendo OK com a pata.

Tantas coisas mais importantes para a sociedade ficar preocupada, e tem um monte de babaca se doendo por bobagem. Realmente, esse mundo está perdido.

Comentários