Tosqueiras de Jogos de Tabuleiro

Sempre existem as modinhas. Isso é a coisa mais normal do mundo, uma bela hora surge alguma coisa nova e todo mundo corre atrás. Vale em tudo: tem as modinhas de moda mesmo, no estilo de se vestir, com as tais "cores da estação" que todo mundo usa; tem as modinhas de penteado, como por exemplo o pessoal que pinta os cabelos de cores diferentes ou os negros posando o black power como forma de afirmação de raça; tem as modinhas musicais, geralmente com aquela música-tema da novela da Globo ou o novo hit de um pseudo-cantor que apareceu no Faustão; tem as modinhas fitness, como nego fazendo cross-fit pra postar no "Feice" ou fazendo a nova dieta inventada pela youtuber; tem as modinhas de estilo de vida, como a turminha sofisticada que só bebe cerveja artesanal ou come em food truck. E assim por diante.

E outra coisa que está na moda agora são os jogos de tabuleiro. Ah, desculpe... Boardgames.


E não exatamente esses jogos clássicos aí de cima. Claro que tem muita gente voltando aos tempos de nostalgia com Detetive, Palavras Cruzadas e Banco Imobiliário, mas o grande foco hoje são jogos modernos de diferentes estilos e temas. Muitos deles com cartas e miniaturas, é a nova tendência de hoje.

Confesso que eu até acho esses jogos interessantes. É uma distração bem divertida, muitas vezes mais agradável do que sentar na frente de um computador pra ficar jogando. A principal diferença é que eu sempre gostei de jogos assim, desde a minha infância. Já fiz posts sobre aquele antigo RPG de miniaturas, o Aventuras Heróicas, que ainda está aqui guardado comigo, assim como de jogos antigos que "se perderam" como o RPM e o Carga Máxima. E foram muitas partidas jogando War também, quem não lembra do território de Dudinka?


Realmente, foram poucos os sobreviventes aqui, além do Aventuras Heróicas que eu consegui manter especialmente por conta das miniaturas bem legais, tenho ainda aqui um Banco Imobiliário, que acho que é aquele jogo que muita gente tem em casa. Tudo isso por conta de não ter com quem jogar, a maioria dos meus conhecidos na época curtindo mais os jogos de videogame ou mesmo achando os jogos que eu tinha meio chatos. Tinha que assim recorrer a jogos solitários, mesmo o Aventuras Heróicas eu tentava bolar algumas regras para jogar sozinho. 

E aí hoje temos esse "boom" dos jogos de tabuleiro. Não sei o porquê disso, mas imagino que seja aquela mania nostálgica que temos atualmente, com os hipsters que adoram tudo que é retrô. Não sei... Mas a verdade é que hoje em dia os jogos de tabuleiro, que agora são chamados aqui pelo nome em inglês boardgames, se tornaram uma grande febre. São inúmeros jogos de todos os tipos, de cartas, de miniaturas, baseados em filmes e séries, seguindo temas clássicos como guerra, fantasia e zumbis. Temos desde jogos minimalistas e pequenos até grandes produções com mapas gigantescos e caixas enormes. Jogos que são lançados por produtoras e empresas conceituadas e por desconhecidos com a ajuda de campanhas de financiamento coletivo. Qualquer tema que você queira, certamente vai ter aí um monte de jogos para você. É a grande moda do momento. 


Chega a ser engraçado... vários daqueles meus colegas que antes desdenhavam de mim e diziam que os jogos de tabuleiro não tinham graça, hoje se reúnem toda a semana para uma "jogatina". E não me chamam...

E isso me motivou a fazer essa postagem, pois essa avalanche de boardgames venho junto com uma série de coisas associadas que na minha opinião são extremamente escrotas. Algumas delas que são universais, que se aplicam aos jogadores de todo o mundo, e outras que são específicas para os brasileiros. 

Já começo justamente com uma dessas tosqueiras tupiniquins, que é o linguajar boboca que os jogadores passaram a usar ao se referir aos jogos de tabuleiro. Como o "jogatina" que eu citei ali em cima. Na boa, quando eu escuto uma palavra como "jogatina", logo penso em algo ilícito, tipo o cara vai apostar num cassino ou no jogo do bicho. Fica estranho na minha opinião...


Outras palavras que me doem os ouvidos são aquelas que são uma mera "aportuguesação" de termos em inglês. Tipo, em vez de traduzir drop, que seria o ato de largar um item, o pessoal fala "dropar"; pegaram o termo top, que seria meio que chegar ao máximo de alguma habilidade, e dizem que é "topar"; Nos jogos de dados, é comum um reroll, que já é uma palavra meio estranha em inglês, mas que podeira ser simplesmente "rolar de novo" os dados, mas preferem dizer "rerrolar". 

Desnecessário fazer isso... 

Inclusive essa é uma das razões pela as quais eu não gosto de comprar jogos traduzidos: sempre há uma perda da tradução, ou as pessoas responsáveis por ela adotam termos meio toscos e sem graça. Ou então é no português de Portugal, usando termos como "lacaio" para representar minion ou com os verbos na segunda pessoa, como "tu podes" ou "descarte tua carta".


Mas não só os brasileiros que fazem coisas estúpidas. Outra coisa que eu acho tosca no assunto de jogos de tabuleiro está associado aos inúmeros vídeos que tem no YouTube sobre os mesmos. Até aí tudo bem, eu acho válido que existam vídeos que mostrem como é o jogo, fazendo um review de suas características e ajudando às pessoas a conhecerem melhor um boardgame antes de comprá-lo. 

Acontece que eu nunca entendi a quantidade imensa de vídeos de unboxing de um mesmo jogo.


Começando pra quem não entende: unboxing é outro dos termos que os jogadores inventaram, embora também tenha algum sentido e não seja tão bobo assim (até alguém aqui no Brasil inventar o "unboxear"). Serve para indicar o ato em que abrimos a caixa, geralmente usado para mostrar quais são os componentes que vem no jogo. Tudo bem que é algo útil, a pessoa que assiste terá uma idéia de tudo que vem na caixa. Inclusive essa é uma das ações muito realizada pelos desenvolvedores em campanhas de financiamento coletivo, como Kickstarter: afinal de contas, eles contratam produtores para fazer o jogo, e o vídeo de unboxing geralmente é feito com o protótipo, para que eles possam mostrar aos seus colaboradores como que o jogo ficou.

O que eu realmente não entendo é o seguinte: por que existem tantos vídeos de unboxing para um mesmo jogo? 

Vejam o exemplo dessa página desse jogo aqui, o link vai direto para a página de vídeos. Considerando o momento que eu olhei, de 52 vídeos disponíveis ali no site, em 14 deles o autor abre a caixa e mostra os componentes. Cerca de 25%, ou 1/4, desses vídeos se referem a unboxing ou ao termo equivalente "what is inside the box".


Qual a necessidade de fazer isso? Tem alguma puta diferença? Tudo bem, talvez o cara esteja mostrando uma versão em outro idioma... mas não é o caso desse jogo em particular. Tá bom, pode ser que o sujeito tenha um canal de boardgames e iria mesmo fazer um vídeo de unboxing daquele jogo. Mas mesmo assim eu não consigo entender por que precisamos de dezenas de vídeos mostrando a abertura de um mesmo jogo. Todos eles vão ser iguais, vão mostrar os mesmos componentes. 

Realmente hoje as pessoas têm essa necessidade fisiológica de aparecer na Internet. Mesmo que seja oferecendo mais do mesmo. E o pior de tudo é que aposto que tem gente que assiste um vídeo de unboxing e depois vai assistir outro. 

Aliás, esse tema dos vídeos de YouTube é algo que eu acho muito engraçado e que se encaixa aqui no tema dessa minha postagem de desabafo. Eu acho interessante como existem muitos vídeos que possuem a proposta de fazer uma avaliação de um jogo. Repito, acho isso muito válido, pois permite que outras pessoas conheçam o jogo e assim possam decidir se vale a pena ou não. Tanto os vídeos com resenhas mais curtas, falando dos pontos positivos e negativos, assim como aqueles onde uma partida inteira é mostrada.

Agora... o que me deixa puto é achar um vídeo desses e ver que em mais de 50% do tempo vemos o autor do vídeo, e não o jogo em si.


Sei que tem muita gente vaidosa, que não pode ver uma câmera e precisa mostrar o rosto. Mas, na boa... se você vai fazer um vídeo que tem o objetivo de mostrar o jogo, foque na pôrra do jogo, cacete! Se eu quero ver como que o jogo funciona, como que são os seus componentes, eu quero vê-los, e não a cara do sujeito que está gravando o vídeo. Não precisa ficar aparecendo tanto assim, aproveita a câmera pra mostrar as peças, pra mostrar as cartas e mapas. Esse deveria ser o objetivo.

Claro, não estou dizendo que a pessoa não possa aparecer. Se apresenta no início do vídeo e se despede no final com suas conclusões, ou então até investe um pouco em uma segunda câmera para que o seu rosto apareça em uma janela menor no canto do vídeo, como é comum hoje em dia em aulas de ensino à distância. Mas entenda que se alguém entrou na página pra ver o vídeo de um jogo, o interesse dessa pessoa é em ver o jogo, e não a cara do autor.


Até porque geralmente o sujeito gravando será um nerd cheio de espinhas, uma garota repleta de tatuagens e piercings ou um carinha hipster de cavanhaque engomado e chapéu. 

Ainda nessa linha dos vídeos, tem outra coisa que eu acho muito engraçada. Esses vídeos de reviews e apresentação dos jogos em algumas situações são grandes produções, onde a pessoa investe tempo (e provavelmente dinheiro) para criar um ambiente adequado para a gravação, às vezes até com efeitos especiais. Outras vezes é o contrário, onde o sujeito simplesmente liga a câmera e começa a jogar um jogo na mesa de jantar de casa, com todos os seus móveis ao fundo. Tosco, alguns podem dizer, mas diria até que não é nada demais, demonstra apenas uma falta de preocupação com o cenário, ou mesmo preguiça de fazer algo mais arrumado, resultando em um vídeo amador mas que cumpre seu papel.

Agora, algo que eu vejo com muita frequência e me deixa meio de nariz torto é a necessidade de mostrar uma parede de caixas de jogos de tabuleiro no fundo.


Por quê?

Puta que parola, por que fazer isso? Eu realmente não entendo...

Alguém provavelmente vai dizer "ah, Texugo... deixa de ser babaca. Que mal tem o sujeito colocar ali um montão de jogos no fundo?". Sim, talvez não tenha nada de mal, mas é outra coisa que parece ser quase como uma marca registrada pouco original de todos os autores de vídeos sobre jogos de tabuleiro. Pois na imensa maioria desses vídeos é a mesma coisa, o cara na frente das câmeras e uma caralhada de caixas dos mais diversos jogos ao fundo.

Sei lá... se a pessoa trabalha numa loja de jogos, até vai. Está ali em seu ambiente de trabalho. Tipo a mocinha simpática abaixo, que certamente está ali diante de prateleiras da loja onde trabalha, já que há caixas repetidas de determinados jogos. E mostrando que sim, também tem gatinhas jogando boardgames.


Mas, quando é uma pessoa normal, um mero qualquer um que tem uma webcam e um canal no YouTube, eu acho que fazer isso indica muito mais um transtorno psicológico. Pra começar, fico imaginando o quanto o sujeito deve gastar pra comprar tanto jogo assim. Pois os boardgames estão longe de serem baratos, tem alguns aí que custam algumas muitas dezenas de dólares, ou mesmo chegam na casa dos três dígitos.

Claro... e aqui no "Brasiu" os jogos saem mais caro ainda... Você pagaria 3 mil pratas num boardgame?


Imagina então acumular dezenas, ou até mais de cem jogos? Diria que é um vício... Pode não fazer mal a saúde a princípio, mas certamente dói bastante na carteira. Claro, cada um é livre pra gastar seu dinheiro como quiser, mas acho que muitos desses "boardgamers" têm uma grande falta de controle a ponto de comprarem tantos jogos assim.

Mas voltando à "parede de jogos", eu realmente não vejo necessidade da pessoa fazer isso. É quase como se o babaca quisesse aparecer mesmo. Mostrar pra todo mundo a imensa coleção de boardgames que tem, exibindo jogos de todos os tipos, com aquela cara de paspalho de "olha só o que eu tenho". Repito, isso pra mim é indício de problema na cuca, de uma falta de auto-estima. Quer tanto aparecer, pendura uma merda duma melancia no pescoço, pombas!

Aliás, fico aqui matutando um pouco mais sobre essa forma de guardar as caixas dos jogos, geralmente em uma estante estrategicamente colocada no campo de visão da câmera. Não apenas pela questão do preço, mas questiono aqui a praticidade de tal arrumação. São caixas empilhadas umas sobre as outras, fico pensando na dificuldade que seria pra pegar um jogo, especialmente se ele estiver na parte de baixo da pilha.


Além disso, por que as pessoas compram tantos jogos assim? Me desculpe, mas olha a foto acima, a grosso modo eu contei ali cerca de 45 jogos, lembrando que essa aí é provavelmente só parte da estante do maluco. Mas consideremos esse número pra facilitar...

Puta merda, quantas vezes será que ele vai jogar cada um desses jogos? Não duvido que devem ter alguns boardgames ali que levam horas de jogo, não é um mero Paciência que você termina em cinco minutos. Não tem como, só se o sujeito não faz nada mais da vida além de jogar boardgame. É um exagero ter tantos jogos assim...


A não ser que seja apenas pra colecionar, pra dizer que tem. E pra mostrar no vídeo...

Enfim, realmente são várias coisas toscas que eu percebo agora nessa nova onda de jogos de tabuleiro. Mas o curioso é como que em todas essas coisas bizarras que eu citei acima, dá pra perceber que em nenhum momento eu estou fazendo uma crítica aos jogos em si. Tudo recai sobre as pessoas, sobre os jogadores. O que eu acredito que só comprova como cada vez mais eu estou me enchendo da sociedade, daqui a pouco vou fugir pra uma ilha deserta e me isolar do mundo.


Pois o pior dos boardgames são os jogadores mesmo. Por isso que eu acabo buscando jogos solitários, pra evitar os diferentes tipos escrotos que temos que aturar em uma mesa. Que é outra coisa que me tira do sério quando o assunto são esses jogos.

Tem diferentes tipos... Pra começar, existem aqueles que posam como os entendidos do universo de jogos de tabuleiro, que não perdem a oportunidade de dizer que já jogou trocentas partidas, que tem porrilhões de jogos e por aí vai. Segue na linha das bestas que posam nos vídeos com a parede de jogos no fundo, não passam de babacas com vontade de aparecer. Outro tipo escroto são os advogados das regras, que ficam ali enchendo o saco por qualquer vírgula no manual, questionando as jogadas dos colegas mesmo quando todo mundo sabe que ele está errado. Ou então aqueles chatinhos escrotos que ficam aporrinhando todos por míseros detalhes, tipo brigando para jogar com o peão de uma determinada cor ou insistindo em jogar os dados de novo, porque eles "caíram no chão e não valeu".


Por isso que tem muito jogo que termina em discussão...

Mas claro que os piores são os maus vencedores e maus perdedores. Sempre tem aqueles que ganham a partida e depois ficam arrotando prepotência, se vangloriando da estratégia infalível que ele usou, mesmo quando estava jogando algo tão aleatório como Batalha Naval. Com o nariz empinado e o sorriso amarelo no rosto, esses estúpidos costumam ficar horas falando de sua vitória, dizendo que os outros não têm chance e que foi moleza vencer... até perder a próxima partida. Ou então até alguém dar um murro na sua boca.

E os maus perdedores então? Ficam cheios de ódio quando perdem, dizem que o jogo é uma bosta e que não presta. Acusam os outros de terem roubado, tipo "você espiou as minhas cartas" ou coisa parecida. Xingam o vencedor, dizem que jogo de tabuleiro não tem graça e esbravejam pelos cantos. Apenas mostrando para todo mundo que não passa de um baita de um bebê chorão.


Repito: se é pra aturar tipos assim, prefiro jogar sozinho.

Pois bem, a verdade é que os jogos de tabuleiro parecem ter voltado para ficar. Como disse, na minha opinião eu acho até legal, é uma boa alternativa ao mundo digital que está por todos os lados hoje em dia, e diria que para aqueles que sabem aproveitar essa diversão "offline" é um passatempo agradável.

Mas é fato de que os boardgames são a mais nova modinha... de forma que a quantidade de manés que estão sentando nas mesas pra jogar dados e cartas é enorme, e que só fazem isso porque todo mundo está fazendo. E com isso, aqueles que curtem de verdade precisam aturar essas baboseiras de metidos a experts dos jogos e que só passam vergonha. Sempre fui um texugo que se afastava das modinhas pra justamente ficar longe desse tipo de gente boba, estilo "Maria-vai-com-as-outras", mas confesso que o gosto em jogar jogos de tabuleiros, algo que eu trago desde a minha infância, me fez voltar a esse mundo apesar de tanta gente babaca nesse meio.


Agora, vamos ver quanto tempo leva pra que o universo dos jogos de tabuleiro se livre das expressões sofríveis como "dropar", das centenas de vídeos de unboxing de um mesmo jogo e dos vídeos de resenha do Youtube mais focados na cara do apresentador e na sua parede de caixas de jogos...

Comentários

Jorge W disse…
Pra mim essas prateleiras cheias de jogos me lembra aqueles retardados exibidos que colocam na casa uma prateleira cheia de livros grossos que nunca leu pra pagar de "entendido", inteligente e especial
Texugo disse…
Pois é, esse é meu sentimento. Essa turma tem uma vontade de se exibir imensa, ou então o ato de "ter" e "colecionar" um montão de jogos é mais forte do que de fato jogá-los...